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Casa da Cultura - Literatura - Contos

Sol

Caius_c

Um dia, o grande feiticeiro Jocabú, que de grande só tinha a maldade, apagou o sol. Ele soprou seu hálito fétido e a luz vacilou. A bruxa má Giteft, que não seria assim se tivesse o amor dos homens, ajudou-o nesta tarefa tenebrosa. Ela derreteu todas as cores e tudo se transformou em um vasto negro e marrom. Quando as cores se foram, o sol apagou.

Ele pediu ajuda aos céus e foi atendido. Um anjo, que tinha por nome Ale*, que não tinha tanto poder quanto os demônios, mas que tinha um coração em forma de estrela, lhe deu alguns presentes que não trariam o sol de volta, nem as cores, mas traziam as formas, os cheiros e muitas sensações. Mas estes presentes eram caros e Ale* não podia dá-los de uma só vez. Mas, ela lhe trazia um pinguinho de cada vez, até poder completá-los.

Mesmo com estes presentes, ainda assim, ele não podia caminhar exceto dentro de algumas paredes. Aprendeu a contar passos, a sentir a direção do norte e a colocar em uma tela de cinema, que existia em sua mente, todos os objetos, móveis e utensílios que tinha que evitar ou usar.

Dentro daquela escuridão que Jocabú e Giteft lhe tinham arranjado, existia uma pequena luz, tão trêmula e bruxuleante que, às vezes, achava que iria se apagar. Essa luz era um sonho: o sonho de poder andar pelas calçadas e ruas pelas quais tinha caminhado em outros tempos, em outra vida.

Bem que tentou algumas vezes mas nunca conseguiu sair alem do quadrilátero em que sua casa morava. Havia perigos que não existiriam se houvesse luz em seus olhos. Sempre tinha pequenas ajudas de transeuntes, amigos e família, mas elas nunca eram no momento em que a vontade de sair ficava mais forte.

Por isso, se quedava em casa, escutando sons, sentindo cheiros e percebendo presenças que nunca mudavam. Seria uma prisão eterna se não existisse um Sol em algum lugar.

Podia ser que não acontecesse o que aconteceu. Podia demorar muito mais ou ser outro. Mas, não foi. Já de começo sentiu-se amigo dele e percebeu que ele também queria carinhos e confortos. Queria companhia e ficar ao lado de alguém.

No primeiro afago já sentiu a sintonia de amizade que parecia inerente aos dois. Tocaram-se, cheiraram-se e sentiram-se. Foi mais que o suficiente. Disseram-lhe que tinha cor dourada, macia e longas, que ele percebeu no primeiro toque. Foi um afago bom, desses de se apaixonar. O pequeno sonho que parecia apagar-se de vez em quando ganhou o tamanho de uma grande fogueira. Fez-se a luz.

Agora, andando pelas ruas, percebe as maravilhas de ser um andarilho. Ainda precisa de pequenas ajudas de passantes e umas poucas informações. Ele as traduz para Sol em uma linguagem que só eles conhecem. Sol apruma-se e o carrega  para onde ele quer chegar. Ambos seguem pelas vias, sorridentes, como um só, sem temor, com amor.

Leia outros contos do autor:
[Pedrinho e o sonho]
[O toureiro e o violino]


O autor, Caius_c, nome literário de João Alberto Padoveze, tem um livro sendo publicado pela Editora Siciliano, chamado "Você só tem uma vida". Em parceria com seu irmão, tem um outro livro publicado chamado "Contos de Interior", que é uma coletânea de contos que vão da crônica ao surreal. O autor mantém dois sites para divulgação de seus textos, poesias, contos e livros. O texto "Ouça o tambor" foi interpretado pelo ator Antonio Abujamra no programa Provocações, da TV Cultura. Outros textos foram publicados por jornais da região como Todo Dia e O Liberal.

Contatos: caius_c@hotmail.com

Página Publicada em 01/08/2005