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Seção de Crônicas da Casa da Cultura

Discos voadores e Toninho do Diabo

Cerito Silva

 

É curioso como os que querem acreditar apegam-se às historias mais bizarras da ufologia com facilidade, enquanto rejeitam evidências óbvias.

Essa história de extraterrestres invasores é muito mau contada. Nenhuma das evidencias apresentadas até hoje pelos ufólogos consegue manter-se num debate serio. Já estive com pessoas que realmente acreditam que foram abduzidas, que conversam com alienígenas de outras galáxias por telepatia ou pela televisão num canal sem sinal, algumas delas até perdem dinheiro nessas coisas e nisso são parecidas com os fãs de FC&F, diletantes por natureza, e tem minha simpatia por isso. Entretanto, eu não acredito em discos voadores. Mas como já vi coisas estranhas, acredito em OVNIs. Mas é bom que se lembre que OVNIs não são necessariamente discos voadores; como define a sigla, são objetos voadores não identificados, podem ser qualquer coisa e é muito mais provável que sejam desconhecidos fenômenos naturais telúricos ou espaciais. O homem sabe pouco sobre a Terra, o universo e seus fenômenos. No dia que OVNIs forem identificados como disco voadores alienígenas, deixarão obviamente de ser OVNIs.

Também acredito que ha vida em outros mundos, por uma questão estatística. Deve haver muitos mundos com vida no universo e algumas devem até ser tecnológicas. Mas eu realmente não acredito que qualquer uma dessas possíveis inteligências veio, vem ou virá fazer macaquices por aqui.

Uma das coisas mais interessantes que vi, encaminhada a mim pelo amigo Roberto Nascimento, foi um artigo que comparava o design dos discos voadores 'registrados' nos anos 1950 com o dos mais modernos, ao mesmo tempo em que comparava estilos dos automóveis dos mesmos períodos. Sendo os terrestres atrasados como somos, é natural que nossa tecnologia primitiva gere novos designs a cada ano, dando aos antigos um ar démodé - até porque essa é uma necessidade do nosso mercado de consumo. Mas nos discos voadores isso não deveria acontecer. E ainda mais, não deveria acontecer no mesmo ritmo e com as mesmas características estéticas, como demonstravam as imagens desse artigo. Os discos voadores fotografados na década de 40 refletem a estética daquela época, tal como os novos exibem as características de nosso deslumbramento digital. Pra mim isso já é prova suficiente da farsa. Mas já estou ouvindo aquela vizinha crédula do meu cérebro de réptil, sempre paranóico, dizendo:

'Tolinho! Todo o design terrestre é orientado pelos aliens, é a nossa estética que acompanha a dos discos voadores.'

Mas tenho mais uma historia que é de arrebentar de rir.

Quando eu produzi as HorrorCons* conheci um monte de gente estranha e um dos mais exóticos é Toninho do Diabo. Um cara divertido que adorava o evento e nele realizou as performances mais hilárias que os fãs de horror já viram nesta cidade. Numa delas ele queria matar um frango a machadadas, mas o espetáculo foi vetado para não dar problema com a SPA. Sem perder a deixa, Toninho esquartejou, ao vivo, um cacho de bananas... Toninho produz curtas metragens de terror e vimos alguns deles nas HorrorCons. Certa vez ganhou U$10 mil nos EUA num desafio para enterrar-se vivo mas nem precisou:  o desafiador amarelou na hora. Ganhou de um fã gringo uma replica do carro do filme Cristine (que ele vendeu para fazer um de seus filmes) e também ganhou do próprio Gene Simmons um par daquelas botas-plataforma que ele usa no Kiss. Ha poucos meses ele esteve num programa de TV 'debatendo' com outro farsante da nossa mitologia urbana moderna, o tal de Inri** - alias, um dos mais hilariantes momentos da TV brasileira. Portanto vocês podem imaginar que o que vou contar a seguir pode mesmo ter acontecido. Pois bem, uma vez ele trouxe pra mim (acho que ainda tenho isso guardado) recortes de jornais que 'documentavam' as marcas de pouso de um disco voador numa cidade do interior paulista. Os proprietários da chácara onde estava o local do 'pouso' juravam que tinham visto luzes misteriosas, um objeto pousado e seres estranhos vagando pela mata a noite. O caso ganhou repercussão na região e muitos ufólogos o investigaram.

Pois bem, ocorre que nunca houve disco voador nem alien nenhum. Os responsáveis por isso foram os participantes de uma equipe técnica de filmagem e atores amadores (entre eles o próprio Toninho) que haviam invadido clandestinamente a chácara, sem avisar o proprietário, para fazer tomadas para um de seus curtas-metragens. Usaram spots, explosões de fumaça e uma estrutura cenográfica de arame e papelão; foi isso que o chacareiro viu no mato, alem do próprio Toninho, a caráter. A turma deu no pé quando percebeu que o chacareiro estava vindo armado para ver o que estava acontecendo e, no dia seguinte, na moita, acompanharam entre assustados e divertidos a confusão na cidade. Se se revelassem poderia haver problemas.

As marcas deixadas pela atividade da equipe foram tomadas pelos ufólogos como prova do desembarque de alienígenas no local, inclusive as cinzas de uma fogueirinha que eles fizeram foi considerada como a marca incontestável de um jato de propulsão química do disco voador...Um tempo depois o próprio Toninho tentou desmentir tudo, foi ao jornal da tal cidade e mostrou fotos das cenas que eles filmaram naquela noite e da estrutura que todos imaginaram ser o tal disco voador... ninguém acreditou nele.

* [Nota editorial da Casa da Cultura]: HorrorCons foram convenções sobre literatura, cinema e multimídia versando sobre o tema "Horror".

** [Nota editorial da Casa da Cultura]: Inri Cristo é um homem que afirma ser Jesus Cristo.


O autor, Cerito Silva, é escritor e editor de Ficção Científica

Contatos: cerito@terra.com.br
Sítio Web: www.hiperhistoria.hpg.ig.com.br

Página publicada em 15/12/2004