BUSH, NOBEL DA PAZ
André
C S Masini
Era só o que faltava:
agora indicaram George Bush para o prêmio Nobel da Paz.
E não é mal-entendido, não. O tal indicado
não é algum religioso desconhecido, que consagrou
a vida à filantropia, mas que, por infelicidade, foi batizado
com o mesmo nome do raivoso ocupante da Casa Branca... Não.
O indicado é mesmo o Bush que bem conhecemos.
Do jeito que as coisas
estão indo, daqui a pouco vão querer premiar o "seu
Creysonn", do Casseta e Planeta, com o Nobel de Literatura;
o Maguila, pugilista, com o Nobel da Física; e o dr. Sócrates,
ex-jogador do Corinthians, com o título de Miss Universo...
A única dificuldade será escolher o "Nobel da Honestidade",
pois além dos naturais candidatos tupiniquins: Jorgina
de Freitas, Lalau, Rocha Mattos, Fernandinho Beira-Mar... há
os fortíssimos concorrentes estadunidenses, a começar
por Dick Cheney e a quadrilha do próprio Bush...
Os tempos em que vivemos
são mesmo estranhos: "paz" parece significar "guerra",
"bem" parece significar "mal", e "vergonha" parece não
existir.
A Fundação
Nobel nasceu da herança do químico
e engenheiro sueco Alfred Nobel,
inventor da dinamite. Ele disse em testamento que sua fortuna
deveria ser usada para a criação de uma fundação
e que essa fundação deveria oferecer anualmente
prêmios para aqueles que "produzissem os maiores benefícios
para a humanidade". Ele especificou cinco áreas para os
prêmios: física; química; medicina (ou psicologia);
literatura e, por último: "para a pessoa que tiver feito
o maior ou melhor trabalho pela fraternidade entre as nações,
ou pela abolição ou redução dos exércitos
e forças armadas...". É esse o prêmio
que pretendem dar a George Bush!
Tal proposta é não
apenas imoral, mas um crime no sentido estrito da palavra. Conceder
o Prêmio Nobel da Paz a um semeador de guerras como
Bush, significa simplesmente usar dinheiro de um testamento para
fins diametralmente opostos aos fins para os quais o dinheiro
deveria ser usado... ou seja, um crime.
A absurda indicação
de Bush foi possível por ter sido feita segundo as "normas"
do Comitê Nobel Norueguês... Ironicamente sempre houve
"normas" para justificar as maiores barbaridades da história
da humanidade: a escravatura, o holocausto, o genocídio
dos povos das Américas... O fato é que, burocracias
à parte, a indicação de Bush é um
insulto à Paz, à verdade e à vontade
de Alfred Nobel; e, portanto, as "normas" do Comitê Nobel
Norueguês estão erradas e devem ser mudadas.
Os Prêmios Nobel
de outras áreas (que estão a cargo de instituições
suecas) têm sido concedidos segundo critérios rigorosos
e cristalinos. Os méritos dos premiados têm sido
invariavelmente reconhecidos de forma quase unânime pelas
autoridades internacionais nos respectivos campos. Apenas o Nobel
da Paz tem sido diferente, muitas vezes atendendo mais a conveniências
políticas ou interesses, do que à vontade de Alfred
Nobel, ou a possíveis "benefícios para a humanidade".
A espúria indicação
de Bush partiu de um político norueguês chamado Jan
Simonsen. Simonsen não passa de um oportunista qualquer,
sem relação direta com o Comitê Nobel Norueguês;
e o Comitê -- que solicita enfaticamente que não
se publiquem os nomes de indicados -- provavelmente ignorará
essa indicação. Mas ignorar não basta.
A indicação
de George Bush -- que não conhece outra linguagem senão
a da força bruta; e que através de mentiras forçou
uma guerra torpe e causou a morte de milhares de civis inocentes
-- para o Prêmio Nobel da Paz é um golpe na
credibilidade da Fundação "Nobel" e do nome "Nobel".
Portanto o Comitê Nobel Norueguês deveria rejeitar
publicamente essa indicação, e modificar suas regras
para que tais brincadeiras não sejam mais consideradas
indicações.
O Comitê Nobel Norueguês
já cometeu muitos erros no passado e precisa urgentemente
definir seu rumo, pois, do jeito que as coisas vão indo,
não estará longe o dia em que irá conceder
prêmios ao "Pai da Antropologia", o nobre, leal e abnegado
preservador de culturas Francisco Pizarro, ou ao "Pai da Concórdia
e da Tolerância", o sereno e equilibrado Adolf Hitler.
[Veja o testamento
de A. Nobel: http://www.nobel.no/eng_com_will2.html]
O autor é Escritor,
Auditor Fiscal da Receita Federal
e Diretor Geral da Casa da Cultura.
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