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MODERNIDADE (2. INFORMÁTICA)

Na semana passada vimos o sugestivo caso de um fogão ultramoderno que não serve nem para cozinhar, nem para assar. Agora convido o leitor a uma reflexão sobre a informática: originalmente um instrumento nas mãos do homem, hoje uma caixa-preta de mistificação e alienação.

Quando comecei a programar, em 1979 na USP, o computador era um Burroughs B 6.925. Uma máquina caríssima e gigantesca, que ficava em uma sala privativa, climatizada, freqüentada apenas por graves pessoas de avental branco. Sala que só consegui ver através de uma janelinha, equilibrando-me sobre os ombros de um colega. A única interação entre nós, usuários, e o computador era através de uma leitora de cartões perfurados e uma impressora...

Mas toda essa distância era apenas física (existia apenas devido ao alto valor da máquina). Espiritualmente, o computador estava em nossas mãos. Era uma ferramenta; complexa, cara e protegida, mas apenas uma ferramenta; como uma pá de pedreiro. Éramos nós, usuários, que comandávamos... Claro que, para isso, era preciso antes estudar e aprender um pouco, da mesma forma que precisamos aprender para dirigir um carro ou assentar tijolos... Mas é justamente esse esforço que distingue um homem livre de um escravo.

Hoje tudo mudou. Computadores são vendidos nas esquinas... podemos montá-los, desmontá-los, comprá-los, usá-los, abusá-los e atirá-los ao lixo... Mas eles são tão estranhos a nós como se tivessem caído de um disco voador. Podemos possuí-los; mas não os controlamos, não os entendemos, não os comandamos. São exatamente o oposto do velho B 6.925, pois tocamos seus corpos; mas não suas almas.

Quem os transformou nisso foi esse totem monolítico da modernidade: o Windows, que partindo do mito de que hoje tudo pode ser conseguido sem aprendizado ou esforço, tentou transformar o computador em uma coisa pronta, uma bugiganga de consumo, que você compra, enfia na tomada e usa... como uma pá de pedreiro que vem com a parede já pronta.

Mas como é possível tal automatismo? Como é possível alguém erguer uma parede sem nunca antes ter pego em uma pá de pedreiro?

Obviamente, não é possível. Ninguém mais ergue parede alguma. Todos apenas acatam as paredes prontas e acabadas do Windows: engenheiros, mestres de obra, ou quem nunca viu cimento e tijolo antes, todos nivelados. O Windows não admite exceções, sua rigidez é absoluta.

No Windows, a única lógica que existe é a pseudológica do próprio Windows. "Opções" pode estar sob "Editar", ou sob "Ferramentas", apesar de não ter qualquer ligação racional com uma coisa ou outra... As formatações a nível de caractere (e.g. palavra estrangeira em itálico) são confundidas com formatações a nível de estilos, em uma mixórdia incoerente que pode causar até a perda da formatação a nível de caractere! É como se martelo não mais se distinguisse de chave de fenda ou alicate. E, com isso, a capacidade de pensar do usuário torna-se um resíduo inútil.

Inúteis também se tornam as milenares noções de ordem e organização, pois a maioria dos programas simplesmente presume que os dados estão em um certo diretório C:\Meus Documentos, uma espécie de caldeirão da gororoba, onde tudo é atirado indistintamente.

Assim, sem acesso à caixa-preta - ao poço negro e impenetrável do código do Windows - somos todos obrigados a repetir eternamente as mesmas e tediosas tarefas inúteis. Eu preciso de 23 intermináveis cliques de mouse, eternamente iguais, para realizar a mesma tarefa que realizava com apenas duas letras e um enter no prompt do Unix, CP/M ou DOS. E não há força sobre a terra que faça o Windows amenizar seu autoritarismo e me permitir simplificar essa tarefa.

E tudo isso em nome dos usuários que nunca viram um computador, como se estes não fossem naturalmente acabar aprendendo com o tempo...

Mas isso é a modernidade: o imediato substituindo e recalcando o aprendizado natural; a aparência substituindo a essência; a tela abarrotada de baboseiras substituindo a simplicidade da ferramenta que aguarda um comando... Simplicidade que talvez machuque o vazio da alma do homem moderno, que vive na era das trevas... que é agora.

Mas há uma saída: LINUX - um sistema operacional gratuito e aberto, muito mais estável e eficiente que o Windows, e sem caixa-preta, sem rigidez... Para muitos, uma luz no fim do túnel.

Continua na próxima semana...

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