|      MODERNIDADE ( 3. A CIÊNCIA ) Nos dois 
                artigos anteriores vimos um fogão ultramoderno que não 
                serve nem para cozinhar nem para assar, e um sistema operacional 
                de computadores que nos obriga a seguir, passo a passo, seu rígido 
                e ineficiente modo de fazer as coisas. Hoje discutiremos a evolução 
                da ciência. Do mesmo caldeirão 
                cultural de onde saem tantas idéias que exaltam a modernidade, 
                vem também a noção de que a ciência 
                está evoluindo cada vez mais rápido, num ritmo que 
                faz as eras passadas parecerem um marasmo de atraso e estagnação. 
                Mas essa noção é inteiramente falsa! e a 
                verdade é quase o contrário dela. Se compararmos 
                nossos últimos 70 anos com um período equivalente 
                – escolhido do século XIX ou do início do 
                século XX – veremos que o avanço científico 
                deles foi muito mais rápido e revolucionário que 
                o nosso. Até 1800 – ano em que o italiano 
                A. Volta (Volt) criou a bateria – 
                os conhecimentos sobre eletricidade restringiam-se quase que exclusivamente 
                ao fenômeno da eletricidade estática: sabia-se dos 
                materiais isolantes e condutores, da lei do quadrado da distância, 
                e de quase nada mais. Ninguém imaginava que a eletricidade 
                tivesse relação com o magnetismo, nem que ambos 
                tivessem relação com a luz, nem muito menos que 
                essas três coisas tratavam-se na verdade de distintas manifestações 
                de um mesmo fenômeno: uma das quatro forças fundamentais 
                de nosso universo: o eletromagnetismo. Aí as coisas mudaram rápido: 
                em 1820, Orsted descobriu que eletricidade e 
                magnetismo estavam relacionados, e Ampère 
                demonstrou a forma cilíndrica do campo magnético 
                em volta de um fio elétrico. Em 1821, Faraday idealizou 
                o motor elétrico; e, em 1831, o dínamo. 
                Em 1845, Faraday ampliou a família da 
                eletricidade-magnetismo trazendo para ela também a luz. 
                Em 1862, Maxwell escreveu: (...) a luz consiste 
                nas ondulações transversais do mesmo meio que é 
                a causa dos fenômenos elétricos e magnéticos, 
                e, em 1864: a luz é um distúrbio eletromagnético 
                propagado (...) de acordo com as leis do eletromagnetismo.  O mundo havia compreendido o eletromagnetismo. 
                Apenas 64 anos haviam se passado desde que Volt 
                – num mundo onde eletricidade significava apenas raios em 
                pipas ou pedaços de matéria que se atraíam 
                e repeliam – criara a bateria.  Mas as duas grandes revoluções 
                da física ainda estavam por vir. Em 1887, Michelson 
                e Morley demonstraram que a velocidade da luz 
                não era afetada pelo movimento relativo da Terra através 
                do espaço, abrindo as portas para a Teoria da Relatividade 
                Restrita, que Poincaré entreveria 
                em 1989, e que Einstein elaboraria e publicaria 
                em 1905. Em 1916 o mesmo Einstein publicaria 
                a Teoria Geral da Relatividade.  A outra revolução, a física 
                quântica, foi quase simultânea: Surgiu em 1900, 
                com a idéia de Planck de valores discretos 
                para emissão de energia. Seguiram-se a natureza quântica 
                dos fótons (Einstein, 1905), a dualidade 
                partícula-onda (L de Broglie, 1924), 
                o princípio da incerteza (Heisenberg, 
                1927), e o princípio da complementaridade (Bohr, 
                1928). Igualmente do século XIX são 
                as leis da conservação da energia e da 
                entropia, pilares da ciência da termodinâmica; 
                a comprovação da teoria dos germes (~~1850); 
                a genética (1866); a ciência da evolução 
                (1859); a psicanálise (~1890 a ~1910); a 
                radioatividade (1896); o elétron (1897, 
                e com ele a eletrônica: a válvula é 
                de 1904). Que de importante foi descoberto depois 
                de 1930? Houve o transistor (1947); a estrutura do DNA 
                (1953), que ao lado das endonucleases de restrição 
                (1968) propiciou a engenharia genética, campo que 
                obviamente progride hoje. Houve a física de partículas, 
                que também continua a avançar, mas muitos de seus 
                fundamentos permanecem sendo os da física quântica, 
                de até 1928. Hei de ter me esquecido 
                de algo, mas pode-se perceber claramente que nossa era está 
                longe de ser a era da ciência. Estamos na era da tecnologia, 
                dos artefatos, dos instrumentos poderosos. Tão poderosos 
                que sua relação conosco acabou ficando ambígua, 
                e hoje não sabemos bem quem é instrumento de quem. O homem se afastou de sua essência 
                e da essência das coisas, e mergulhou no automatismo de 
                procedimentos. A ciência perdeu-se em detalhes, especializações 
                e aplicações. A propalada idéia 
                da crescente velocidade da ciência é um mito, nascido 
                de nossa ótica distorcida... nascido das trevas da era 
                em que vivemos.  Continua daqui a cerca de 45 dias... |